terça-feira, 22 de julho de 2014

ADOÇÃO: PORQUE A CONTA NÃO FECHA?


22.07.2014
Claudiene M.A. Finotti
Não é só entre as mães biológicas que existem divergências de opiniões quanto ao tipo de parto. No mundo das mães adotivas isso também é realidade. E claro, como em todo caso, quando não se sente a dor do outro, fica fácil julgar, apontar e excluir.
O que quero abordar é o famoso "perfil restrito". Estou falando disso só hoje, mas há tempos percebo, leio e discuto com minhas amigas sobre. Perfil restrito são aquelas características que os pretendentes à adoção escolhem e que são consideradas dificultadoras dos mesmos serem chamados para adotar. Exemplo: Uma criança recém nascida, olhos azuis, sem irmãos.
Usei a expressão entre aspas, pois trata-se de uma interpretação bem particular feita por cada profissional da área, cada um que entra na fila ou mesmo quem vem aqui me ler.
Quando se pretende adotar uma criança, a motivação deve ser uma só: ter um filho. Caridade, meus amigos, se faz nos abrigos, na igreja, na rua,<strike> na chuva, na fazenda. Na fila de adoção não! Logo, se adotar não é caridade, não consigo compreender o julgamento imposto a quem acaso escolhe adotar um bebê e não uma criança já crescida.
A primeira coisa que se deve ter em mente é: Adoção não é programa de governo para resolver o problema social de crianças abandonadas no Brasil. Dito isto, fica mais fácil entender todo o contexto.
Não pensem que não é constrangedor chegar no Fórum e preencher uma ficha com o perfil da criança que queremos como filho, pois é sim. Nos sentimos de fato em um supermercado escolhendo algo. Por isso é necessário que o/os adotantes pensem muito sobre o que desejam e cheguem a um consenso sobre o que os fará felizes. Não adianta escolher um perfil bem diferente daquilo que ordena seu coração, na ansiedade do filho chegar logo (obrigada, Daniele, por me ajudar a entender isso). Claro, conheço inúmeros casos de sucesso de famílias que adotaram crianças com perfil bem diferente do que queriam no início do processo de adoção, mas isso foi um processo natural, um amor que surgiu com a convivência. Nunca, jamais mesmo, violente seu desejo por conta do que os outros vão pensar ou de medo de ficar anos na fila esperando.
Outra questão já bem sabida por muitos é que muitas crianças que chegam bebês nos abrigos acabam lá guardadinhas esperando trâmites processuais quase infinitos até que fiquem maiores e, por consequência, completamente fora do perfil que a maioria dos casais deseja. Eu sei do que estou falando, jamais faria uma afirmação destas de forma leviana. Um dos casos que mais me chocou até hoje foi o de três crianças que ficaram ONZE anos abrigadas aguardando um simples processo de destituição de poder familiar. Perderam a infância e parte da adolescência sem nunca terem tido a chance de conhecer candidatos a pais, pois, obviamente, não estavam disponíveis para adoção no cadastro nacional (CNA). A vida de voluntariado faz a gente se deparar com essas situações bizarras, verdadeiras aberrações.
Diante disso, inocentemente ou de propósito mesmo, as pessoas acabam imputando a nós, os adotantes, que já sofremos tanto, o fato de nossos filhos demorarem, afinal, né, "ficamos querendo filhos recém nascidos enquanto tem tanta criança maior sobrando em abrigo". Eu tenho várias conhecidas que tem perfil bem amplo, que aceitam crianças maiores e mesmo assim ficam muito tempo na fila, pois os processos de destituição do poder familiar são demorados, eles andam de forma inversamente proporcional ao desejo/ansiedade dos candidatos a pais. Não é porque há abrigos cheios de crianças que estas estão disponíveis para adoção, mas este é um tópico que vou abordar em outra ocasião, pois tornaria o texto de hoje bem extenso.
Concluindo, não sou contra adoção tardia, isso nunca! E nem estou aqui para convencer ninguém a optar por um bebê e não uma criança maior ou adolescente. Mas sou contra julgamentos. E sou contra situações precipitadas que podem causar o que na minha opinião é a segunda maior tragédia na vida de uma criança abrigada: A devolução da mesma ao abrigo. A primeira, claro, é o primeiro abandono, o da família biológica.
O mundo da adoção de crianças já é tão sofrido, burocrático e cheio de injustiças que acho que as mães adotivas e profissionais na área tem mais é que se unir em torno de processos mais ágeis e esperas menos angustiantes e não começar a culpar uns aos outros por determinadas escolhas.
http://claufinotti.blogspot.com.br/2014/07/adocao-porque-conta-nao-fecha.html

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