domingo, 5 de outubro de 2014

O SONHO DE PEDRINHO


02.10.2014
Por Orlando Sabka
Pedrinho nasceu e viveu nas ruas de uma cidade de porte médio até aos oito anos de idade. Sua mãe, que vivia nas ruas, era viciada em drogas, principalmente crack e bebida alcoólica e morreu quando o garoto tinha apenas seis anos.
O garoto perambulou por praças e jardins até ser encontrado por uma assistente social que o levou para um orfanato a fim de lhe garantir uma vida mais digna e a possibilidade de uma adoção. Os anos foram passando e a partir de seus onze anos começou a ter o mesmo sonho todas as noites.
O sonho consistia em sair voando num cavalo branco com enormes asas, levando consigo uma sacola média de tecido. Voava sempre para a periferia da cidade, na parte mais pobre e adentrava nas humildes casas e casebres, indo até a cozinha e retirava da sacola diversos pãezinhos, litros de leite, pote com margarina e pacotes com macarrão e feijão.
Em seu sonho visitava diversas residências em altas horas, quando todos estavam dormindo e, o mais importante, é que bastava por a mão na sacola e ir tirando os alimentos, como num passe de mágica. Visitava diversas residências por noite e isso já estava acontecendo há três anos. Quando acordava pela manhã se lembrava do sonho, como se real fosse e isso o intrigava.
Numa determinada noite, ao chegar à cozinha de uma dessas casas da periferia, uma mulher de meia idade estava sentada na cadeira, debruçada sobre a pequena mesa. Chorava e estava muito febril. Pedrinho a observou e viu que estava bastante magra e enfraquecida. Na verdade delirava, pronunciando palavras indistintas. Alguma palavra pode entender, dizia que havia, em cada pulmão, enorme mancha escura e que sua respiração, a cada hora que passava se tornava mais difícil e a febre aumentando.
Pedrinho pôs sobre a mesinha os alimentos, remexeu na sacola e tirou um frasco de antitérmico e uma cartela de antibióticos. Pegou um copo com água de uma talha e deu os medicamentos, na medida certa, para a mulher que delirava. Feito isso a ajudou ir para a cama. Logo a seguir, montou novamente no cavalo branco com asas e visitou mais algumas casas, deixando os alimentos, como de costume.
Após uma semana, retornou à casa da mulher que estava adoentada e a encontrou debruçada sobre a mesinha da cozinha e, quando colocou os alimentos sobre a mesa, a mulher levantou a cabeça e disse:
- Filho, não sei quem é você, mas salvou minha vida. Não sei como agradecer, como também pelo alimento que me traz. Só pode ser um anjo enviado por Deus. Obrigada.
- Eu só sei que meu nome é Pedrinho e faço isso todas as noites há alguns anos. É como se fosse uma missão. Sinto-me feliz por isso. Não sei de mais nada. Acho que é só um sonho.
Dito isso foi embora montado em seu cavalo branco com asas, pois tinha ainda muitas casas para entregar alimentos.
Um ano após esse acontecimento, a assistente social que levou Pedrinho ao orfanato, também visitava a periferia da cidade e algumas mulheres relataram o fato de receberem alimentos uma vez na semana, mas que nunca soube quem e como colocavam os alimentos na mesa da cozinha ou da sala, se as portas sempre estavam trancadas a noite e ninguém nunca viu nenhuma pessoa entrar. Acharam isso muito estranho, mas agradeciam a Deus pela bondosa alma que às ajudava, pois as dificuldades eram enormes.
A assistente social, cujo nome era Vera Lúcia, também esteve na casa da mulher que Pedrinho ministrou os medicamentos e que ficou completamente curada e que havia recuperado alguns quilos. Contou a ela o fato e citou o nome do garoto, Pedrinho. Isso a deixou bastante intrigada, mas, dentro do possível, iria fazer uma visita ao Pedrinho no orfanato, que já contava com catorze anos de idade e tiraria suas dúvidas, se possível.
Passaram-se duas semanas e Vera Lúcia foi até ao orfanato falar com o garoto Pedrinho. Dirigiram-se ao jardim e sentaram-se num banco, sob frondosa árvore.
Pedrinho foi relatando o seu fantástico sonho, enquanto que a assistente social ficava de boca aberta, sem poder acreditar naquela fantástica narrativa. Lágrimas brotavam de seus olhos à medida que o jovem prosseguia com a narrativa.
No final, ambos permaneceram em silêncio por alguns minutos, Vera Lúcia se recompôs e disse ao jovem Pedrinho:
- Isso tudo que você me contou é verdade. Aconteceu mesmo!
- Como aconteceu, se foi em sonho?
- Foi um sonho que acontecia todas as noites e que se tornou realidade. Como se explica eu não sei, mas o dedo de Deus está presente, pois para Ele nada é impossível! – disse Vela Lúcia.
- Não posso acreditar nisso – disse Pedrinho.
- Mas é verdade! Eu estive com muitas dessas pessoas que você ajudou inclusive aquela senhora que estava adoentada. E foi através dela que liguei o fato com você!
- O que eu devo fazer? – perguntou o jovem.
- Nada! Deixar como está e não comentar com ninguém, pois quem irá acreditar?
- Não, não vou falar nada! Não sou louco!
- Pois bem, esse vai ser o nosso segredo para o resto da vida! – disse Vera Lúcia.
Pedrinho continuou com os sonhos diários até completar quinze anos. Logo em seguida, a assistente social conseguiu adotar o garoto que recebeu um sobrenome e que passou a viver em família, com os dois filhos de Vera Lúcia e seu marido, dono de uma oficina mecânica.
Nunca mais Pedrinho teve esse tipo sonho. Levava vida normal e foi-se preparando para enfrentar uma faculdade, de preferência de Medicina.
Fatos estranhos e inexplicáveis acontecem todos os dias, normalmente nunca ficamos sabendo, pois nos passam despercebidos e muitos deles se tornam lendas urbanas.
(*) ORLANDO SABKA e morador em Rondonópolis – E-mail: osabka@terra.com.br
http://www.atribunamt.com.br/2014/10/o-sonho-de-pedrinho/

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