sábado, 4 de outubro de 2014

Os iguais e os (in)diferentes

Atitude adotiva

Publicado em 03/10/2014, às 14h26 | Atualizado em 03/10/2014, às 14h56
Inúmeras famílias são constituídas estritamente a partir dos laços de amor, porque são eles que bastam / Foto: internet Inúmeras famílias são constituídas estritamente a partir dos laços de amor, porque são eles que bastam Foto: internet
Novas declarações acerca das famílias homoafetivas ganham evidência, desta vez pronunciadas em debate de candidatos à Presidência da República: “Dois iguais não fazem filho”. Eis a sentença final. Nas redes sociais repercute a declaração e alguém apresenta novo olhar, lembrando que dois iguais “adotam o que dois diferentes jogaram fora”.
O argumento de que filhos só são feitos por “dois diferentes”, ou seja, por um casal heterossexual, apoia-se no pressuposto de que a constituição da filiação é um processo necessariamente biológico. Evidentemente que não há qualquer sustentação possível para tal argumento, uma vez que a orfandade campeia nos lares de genitores e genitoras que nunca exerceram função paterna e materna.

Dois iguais fazem filho sim, porque filho nasce no amor e só no amor Guilherme Lima Moura
Por outro lado, inúmeras famílias são constituídas estritamente a partir dos laços de amor. Porque são eles que bastam. Vínculos corporais, por si só, não garantem qualquer tipo de conexão real. E bastam alguns anos de experiência para constatarmos isso. É comum existirem amigos que são muito mais irmãos do que os que compartilham nossos genes.
Ora, via de regra, a adoção surge justamente pela insuficiência da gestação biológica como espaço de constituição da filiação. De modo que alguns geram bebês que serão filhos de outros. Gerar e filiar são experiências diferentes que podem ocorrer no mesmo processo, mas nem sempre ocorrem.
Iguais, diferentes, adotar, jogar fora...
Toda a discussão em torno da constituição dos laços de paternidade e maternidade baseia-se, cada vez mais, na presença dos laços de afetivos, como processos inclusivos que transformam crianças e adolescentes em filhos. A adoção é o caminho inevitável para tal construção. Pela gravidez surge um ser humano, mas nem sempre surge um filho. Este, por sua vez, nasce apenas e sempre do amor.
A adoção, como o caminho para o tornar-se pais e filhos, é, portanto, a grande síntese da constituição das famílias. Filhos se reconhecem como tais na medida em que são amados. Eis a legitimidade da paternidade e maternidade por casais homoafetivos. Eis a legitimidade de qualquer paternidade e maternidade.
“Dois iguais não fazem filho”... “Mas adotam o que dois diferentes jogaram fora”. O “mas” é desnecessário. É justamente através da adoção que dois iguais fazem filho sim, porque aquele que foi jogado fora é calorosamente recebido nos seus braços cheios de uma enorme vontade de amar. Dois iguais fazem filho sim, porque filho nasce no amor e só no amor. O mesmo amor que, pela adoção, converte em filho o ser humano abandonado pelos diferentes indiferentes.
*As colunas assinadas não refletem, necessariamente, a opinião do NE10
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Atitude adotiva Guilherme Lima Moura é pai adotivo, integrante do Gead (Grupo de Estudos e Apoio à Adoção do Recife) e professor da UFPE. glmoura@gmail.com
 
 

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