segunda-feira, 13 de fevereiro de 2017

ADOÇÃO COLORIDA (Reprodução)

Sim. O amor de adoção é colorido em única cor. E não se acha em supermercados e em lugar nenhum para comprar. Foi assim depois de um episódio de supermercado que peguei meu lápis para escrever mais uma crônica de adoção.

               Ontem na fila do supermercado virei para o meu amor, em uma confusão de escovas e pentes, e falei o seguinte. Você tem daltonismo, e sempre mistura as cores das escovas, tudo quanto é colorido vira uma única cor.  É uma doença basicamente incurável no Brasil. Mesmo assim, você me ensinou a dirigir com uma paciência invejável e superei meu medo de dirigir e nós nos ajudamos nas cores do semáforo de Boa Vista-RR.

               Também lembrei que você era gago quando criança e venceu a gagueira. E gagueira é uma doença tratável. Hoje você é professor doutor em física em universidade federal, uma das áreas mais difíceis. E nada disso  lhe impediu de ser feliz e vencer. Já pensou quantas crianças com doenças tratáveis estão lá nos abrigos ou daltônicas, ou gagas por tortura de pais problemáticos? Você não seria adotado se fosse criança. Eu era alérgica e tinha raquitismo. Tudo se curou. Nós não sabíamos disso quando fomos entrevistados e exigimos uma criança saudável. Meu filho biológico faz fisioterapia por desvio postural na coluna que também é uma doença tratável.

              Ah! Lembra da Bia? Nós nos apaixonamos por ela e a adotaríamos numa boa se tivéssemos habilitados.  E fico pensando quão feliz a Bia deve estar agora e quanto tempo perdeu para conhecer a felicidade de uma família colorida, somente porque tinha atraso na fala advindo de maus tratos. E quantas Bias existem no anonimato e invisíveis na fila nacional de adoção?

             Então.
             O silêncio deu um gelo naquele corredor enorme...
             Ele parou o carrinho e num abraço me disse: "Ah, amor! Volte lá e peça para mudar de saudável para tratável e o que mais seu coração sentir". E as cores das escovas perderam o sentido.
             Somente agora compreendemos porque o processo de adoção é demorado. Já são cinco meses. Em abril será o curso de adoção. E serão mais uns meses. O quartinho da criança que nem sabemos a cor e a idade está ficando uma graça. Imagino uma menina mulatinha, ora uma negra, ora uma branca, ora um menino, às vezes.

             E hoje fomos conferir a reforma poética da casa para esperarmos a criança. Ganhamos até uma piscina para ficarmos em família. Portanto, Deus é bom o tempo todo. O tempo todo Deus é bom. Ele transforma as cores vibrantes do amor em única cor.

Rosidelma Fraga.

Boa Vista- RR, 12 de Fevereiro de 2017.

Enviado por CRÔNICAS DA ADOÇÃO em 12/02/2017
Reeditado em 12/02/2017

Original disponível em: http://www.recantodasletras.com.br/cronicas/5910019

Reproduzido por: Lucas H.

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